A ESCURIDÃO NÃO PODE EXTINGUIR A ESCURIDÃO. SÓ A LUZ O PODE FAZER.»

MARTIN LUTHER KING




terça-feira, 23 de janeiro de 2018

HOJE TRAGO POESIA...UM DOS POETAS QUE AMO!


Camilo Pessanha (1867-1926), apesar de ter escrito uns quantos poemas, uma obra muito escassa, que foi reunida no livro «Clepsidra», é um dos poetas mais marcantes da literatura portuguesa.

Para Pessanha escrever poesia era um ofício, que exigia consciência da raridade do fenómeno poético, que exige contenção e rigor na execução.

É considerado o expoente máximo do simbolismo em língua portuguesa, além de antecipador do princípio modernista da fragmentação.

Camilo Pessanha buscou em Charles Baudelaire, proto-simbolista francês, o termo “Clepsidra”, que elegeu como título do seu único livro de poemas, praticando uma poética da sugestão como proposta por Mallarmé, evitando nomear um objeto directa e imediatamente.

Depois da sua formação em Direito, Pessanha, em 1894 vai para Macau e ocupando vários cargos por lá fica até à morte, que ocorre por excessivo consumo de ópio, as suas viagens ao continente foram raras.

O seu livro foi publicado, por Ana de Castro Osório, a partir de autógrafos e recortes de jornais. Graças a essa iniciativa, os versos de Pessanha salvaram-se do esquecimento. Posteriormente, o filho de Ana de Castro Osório, João de Castro Osório, ampliou a Clepsidra original, acrescentando-lhe poemas que foram encontrados. Essas edições foram publicadas em 1945, 1954 e 1969.

 EXCERTOS DE ALGUNS POEMAS

Floriram por engano as rosas bravas

No Inverno: veio o vento desfolhá-las...

Em que cismas, meu bem? Porque me calas

As vozes com que há pouco me enganavas?


Há no ambiente um murmúrio de queixume,

De desejos de amor, d'ais comprimidos...

Uma ternura esparsa de balidos,

Sente-se esmorecer como um perfume.


Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar,

Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;

E apesar disso, crê! nunca pensei num lar

Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.


Cansei-me de tentar o teu segredo:

No teu olhar sem cor, --- frio escalpelo,

O meu olhar quebrei, a debatê-lo,

Como a onda na crista dum rochedo.


Tenho sonhos cruéis; n'alma doente

Sinto um vago receio prematuro.

Vou a medo na aresta do futuro,

Embebido em saudades do presente...


Encontraste-me um dia no caminho

Em procura de quê, nem eu o sei.

--- Bom dia, companheiro --- te saudei,

Que a jornada é maior indo sozinho.


Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar,

 Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;

 E apesar disso, crê! nunca pensei num lar

 Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.

Chorai arcadas
 Do violoncelo!
 Convulsionadas,
 Pontes aladas
 De pesadelo...
De que esvoaçam,
Brancos, os arcos...
 Por baixo passam,
 Se despedaçam,
 No rio, os barcos.
 Fundas, soluçam

 ...

 Quem poluiu, quem rasgou os meus lençóis de linho,

 Onde esperei morrer, meus tão castos lençóis?

 Do meu jardim exíguo os altos girassóis

 Quem foi que os arrancou e lançou no caminho?

 Quando a vejo, de tarde, na alameda,

 Arrastando com ar de antiga fada,

 Pela rama da murta despontada,

 A saia transparente de alva seda,

 E medito no gozo que promete

 A sua boca fresca, pequenina,
...

Voz débil que passas,

 Que humílima gemes

 Não sei que desgraças...

 Dir-se-ia que pedes./ Dir-se-ia que tremes,

 Unida às paredes,

 Se vens, às escuras,

 Confiar-me ao ouvido

 Não sei que amarguras....


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