Camilo Pessanha (1867-1926), apesar
de ter escrito uns quantos poemas, uma obra muito escassa, que foi reunida no
livro «Clepsidra», é um dos poetas mais marcantes da literatura portuguesa.
Para Pessanha escrever poesia era um
ofício, que exigia consciência da raridade do fenómeno poético, que exige
contenção e rigor na execução.
É considerado o expoente máximo do
simbolismo em língua portuguesa, além de antecipador do princípio modernista da
fragmentação.
Camilo Pessanha buscou em Charles
Baudelaire, proto-simbolista francês, o termo “Clepsidra”, que elegeu como
título do seu único livro de poemas, praticando uma poética da sugestão como
proposta por Mallarmé, evitando nomear um objeto directa e imediatamente.
Depois da sua formação em Direito,
Pessanha, em 1894 vai para Macau e ocupando vários cargos por lá fica até à
morte, que ocorre por excessivo consumo de ópio, as suas viagens ao continente foram raras.
O seu livro foi publicado, por Ana de
Castro Osório, a partir de autógrafos e recortes de jornais. Graças a essa
iniciativa, os versos de Pessanha salvaram-se do esquecimento. Posteriormente,
o filho de Ana de Castro Osório, João de Castro Osório, ampliou a Clepsidra
original, acrescentando-lhe poemas que foram encontrados. Essas edições foram
publicadas em 1945, 1954 e 1969.
EXCERTOS DE ALGUNS POEMAS
Floriram por engano as rosas bravas
No Inverno: veio o vento
desfolhá-las...
Em que cismas, meu bem? Porque me
calas
As vozes com que há pouco me
enganavas?
…
Há no ambiente um murmúrio de
queixume,
De desejos de amor, d'ais
comprimidos...
Uma ternura esparsa de balidos,
Sente-se esmorecer como um perfume.
…
Não sei se isto é amor. Procuro o teu
olhar,
Se alguma dor me fere, em busca de um
abrigo;
E apesar disso, crê! nunca pensei num
lar
Onde fosses feliz, e eu feliz
contigo.
…
Cansei-me de tentar o teu segredo:
No teu olhar sem cor, --- frio
escalpelo,
O meu olhar quebrei, a debatê-lo,
Como a onda na crista dum rochedo.
…
Tenho sonhos cruéis; n'alma doente
Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente...
…
Encontraste-me um dia no caminho
Em procura de quê, nem eu o sei.
--- Bom dia, companheiro --- te
saudei,
Que a jornada é maior indo sozinho.
…
Não sei se isto é amor. Procuro o teu
olhar,
Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;
E apesar disso, crê! nunca pensei num lar
Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.
…
Chorai arcadas
Do violoncelo!
Convulsionadas,
Pontes aladas
De pesadelo...
De que esvoaçam,
Brancos, os arcos...
Por baixo passam,
Se despedaçam,
No rio, os barcos.
Fundas, soluçam
...
Quem poluiu, quem rasgou os meus
lençóis de linho,
Onde esperei morrer, meus tão castos lençóis?
Do meu jardim exíguo os altos girassóis
Quem foi que os arrancou e lançou no caminho?
…
Quando a vejo, de tarde, na alameda,
Arrastando com ar de antiga fada,
Pela rama da murta despontada,
A saia transparente de alva seda,
E medito no gozo que promete
A sua boca fresca, pequenina,
...
Voz débil que passas,
Que humílima gemes
Não sei que desgraças...
Dir-se-ia que pedes./ Dir-se-ia que tremes,
Unida às paredes,
Se vens, às escuras,
Confiar-me ao ouvido
Não sei que amarguras....
Sem comentários:
Enviar um comentário