A ESCURIDÃO NÃO PODE EXTINGUIR A ESCURIDÃO. SÓ A LUZ O PODE FAZER.»

MARTIN LUTHER KING




sexta-feira, 15 de julho de 2011

QUINTAS DE LEITURA

Ontem terminou as «Quintas de Leitura». Regressa em Setembro. Miguel Guilherme apresentou «QUE VERGONHA RAPAZES»,  onde disse poemas de Bocage, Mário Cesariny, Alberto Pimenta, Adília Lopes,  O Meu Pipi, Alexandre O’Neil e Miguel Esteves Cardoso, entre outros. «Palavras…palavras…palavras…que fazem rir e também ranger os dentes»!

Não lido bem com palavrões, não entram na minha linguagem o que não quer dizer que em certas ocasiões não pense neles, em alturas em que estou mais revoltada, mas ouço-os e aceito quando o sentido é uma expressão de piada e não têm carga ofensiva.
Concordo com esta exposição do MEC sobre os palavrões e espero  não ir «ferir» sensibilidades, até porque quem não conhece isto? No entanto quem possa ser mais susceptível ao palavrão aconselho a ficar por aqui e não continuar a leitura! 



Palavrões - Miguel Esteves Cardoso

"Já me estão a cansar... parem lá com a mania de que digo muitos palavrões, caralho! Gosto de palavrões! Como gosto de palavras em geral. Acho-os indispensáveis a quem tenha necessidade de dialogar... mas dialogar com carácter! O que se não deve é aplicar um bom palavrão fora do contexto, quando bem aplicado é como uma narrativa aberta, eu pessoalmente encaro-os na perspectiva literária! Quando se usam palavrões sem ser com o sentido concreto que têm, é como se estivéssemos a desinfectá-los, a torná-los decentes, a recuperá-los para o convívio familiar. Quando um palavrão é usado literalmente, é repugnante. Dizer "Tenho uma verruga no caralho" é inadmissível. No entanto, dizer que a nova decoração adoptada para a CBR 900' 2000 não lembra ao "caralho", não mete nojo a ninguém. Cada vez que um palavrão é utilizado fora do seu contexto concreto e significado, é como se fosse reabilitado. Dar nova vida aos palavrões, libertando-os dos constrangimentos estritamente sexuais ou orgânicos que os sufocam, é simplesmente um exercício de libertação.
Quando uma esferográfica não escreve num exame de Estruturas "ah a grande puta... não escreve!", desagrava-se a mulher que se prostitui. Em Portugal é muito raro usarem-se os palavrões literalmente. É saudável. Entre amigos, a exortação "Não sejas conas", significa que o parceiro pode não jogar um caralho de GT2. Nada tem a ver com o calão utilizado para "vulva", palavra horrenda, que se evita a todo o custo nas conversas diárias.
Pessoalmente, gosto da expressão "É fodido..." dito com satisfação até parece que liberta a alma! Do mesmo modo, quando dizemos "Foda-se!", é raro que a entidade que nos provocou a imprecação seja passível de ser sexualmente assaltada. Por ex.: quando o Mário Transalpino "descia" os 8 andares para ir á garagem buscar a moto e verificava que se tinha esquecido de trazer as chaves... "Foda-se"!! não existe nada no vocabulário que dê tanta paz ao espírito como um tranquilo "Foda-se...!!". O léxico tem destas coisas, é erudito mas não liberta. Os palavrões supostamente menos pesados como "chiça" e "porra", escandalizam-me. São violentos. Enquanto um pai, ao não conseguir montar um avião da Lego para o filho, pode suspirar após três quartos de hora, "ai o caralho...", sem que daí venha grande mal à família, um chiça", sibilino e cheio, pode instalar o terror. Quando o mesmo pai, recém-chegado do Kit-Market ou do Aki, perde uma peça para a armação do estendal de roupa e se põe, de rabo para o ar, a perguntar "onde é que se meteu a puta da porca...?", está a dignificar tanto as putas como as porcas, como as que acumulam as duas qualidades.
Se há palavras realmente repugnantes, são as decentes como "vagina", "prepúcio", "glande", "vulva" e "escroto". São palavrões precisamente porque são demasiadamente inequívocos... para dizer que uma localidade fica fora de mão, não se pode dizer que "fica na vagina da mãe" ou "no ânus de Judas". Todas as palavras eruditas soam mais porcas que as populares e dão menos jeito! Quem é que se atreve a propor expressões latinas como "fellatio" e "cunnilingus"? Tira a vontade a qualquer um! Da mesma maneira, "masturbação" é pesado e maçudo, prestando-se pouco ao diálogo, enquanto o equivalente popular "esgalhar o pessegueiro", com a ressonância inocente que tem, de um treta que se faz com o punho, é agradavelmente infantil. Os palavrões são palavras multifacetadas, muito mais prestáveis e jeitosas do que parecem. É preciso é imaginação na entoação que se lhes dá. Eu faço o que posso."

7 comentários:

Maria disse...

Subscrevo completamente o texto do MEC!

Beijos.

Bia Jubiart disse...

Muito bom o texto! É a primeira vez que vejo uma dissertação/dissecação do PALAVÃO.

Manuela, aqui em casa não temos hábito de chamar palavrão, aliais não sentimos necessidade dele em nenhum sentido... Só não gosto de estar em ambientes onde tem criança e adulto ficar soltando palavrões de graça.

Se o autor permitir posso copiar? P/ enviar p/ dois amigos, um historiador e outro antropólogo, eles vão gostar mito de conhecer seu amigo escritor...

Beijos, e uma noite relax!

Em@ disse...

Já conhecia o texto do MEC.
Sabias, Manú, que dizer palavrões serve como analgésico no momento da dor?pois, parece que está provado cientificamente que sim.
beijo

Lilá(s) disse...

Sempre achei piada a este Miguel...
Bjs

anamar disse...

Miguel ,
faz parte do meu dia... até nas coisas comezinhas as palvras e os seus jogos são belos...
Público, quase sempre, por ele, sobretudo...
Bom post, Manú,
beijnho
Ana

Lúcia Soares disse...

Manú, não sou adepta dos palavrões, mas eles têm hora e lugar, ora se não! rsrsr
É mesmo verdade que há palavras da anatomia humana muito mais feias que muitos palavrões!
Gostei!
Bom fim de semana!

Unknown disse...

Este texto de Miguel Esteves Cardoso é o máximo. Lemos e logo pensamos:
- E não é que ele tem razão....

Existem já diversas versões deste género que não me surpreendem pela novidade.

Faço os possíveis para não usar este tipo de linguagem, ainda que muito zangado adoptei outras exclamações.

Quando as tenho de ouvir, pois não posso mandar calar ninguém, nem armar-me em moralista, deixo que as coisas corram naturalmente.

Parece-me que a boa linguagem deverá fazer sempre parte da nossa bagagem.