O principal haicaísta foi Matsuô Bashô (1644-1694), que se dedicou a fazer desse tipo de poesia, uma prática espiritual.
Este caminho
Ninguém já o percorre,
Salvo o crepúsculo.
De que árvore florida
Chega? Não sei.
Mas é seu perfume.
O velho tanque -
Uma rã mergulha,barulho de água.
De Herberto Helder, tradutor de poesia de diversas culturas antigas:
Primeira neve:
Bastante para vergar as folhas
Dos junquilhos.
Festa das flores.
Acompanhando a mãe,
Uma criança cega.
Monte de Higashi.
Como o corpo
Sob um lençol.
Ah, o passado.
O tempo onde se acumularam
Os dias lentos.
Eugénio de Andrade, poeta que nunca se integrou em qualquer movimento literário específico, caracteriza-se pelo valor dado à palavra, à imagem, à musicalidade, aproximando-o, entre outros, do simbolismo de Camilo Pessanha. Tende a rejeitar os dualismos da cultura ocidental, representando o Homem como um ser integrado numa realidade colectiva. Surge por vezes a analogia entre as idades do homem e as estações do ano e, através de descrições ou evocações físicas, tenta versar a plenitude da vida, a pluralidade dos instantes. São muitos os poemas breves ou de versos curtos, aparentemente simples, mas de grande profundidade:
Tocar um corpo
e o ar
e a língua de neve.
Tocar a erva
mortal e verde
de cinco noites
e o mar.
Um corpo nu.
E as praias fustigadas
pelo sol e o olhar.
Tocar um corpo
e o ar
e a língua de neve.
Tocar a erva
mortal e verde
de cinco noites
e o mar.
Um corpo nu.
E as praias fustigadas
pelo sol e o olhar.
Albano Martins, tem-se distinguido particularmente no campo da poesia, do ensaio e da tradução. A sua obra poética caracteriza-se pelo encontro equilibrado entre a contenção (forma breve e linguagem depurada) e o poder imagético da palavra (suas inúmeras possibilidades associativas e metafóricas): “O ritmo / do universo/ cabe,/ inteiro,/ na pupila/ dum verso.” Em 1995, editou poesia haiku de sua autoria, sob o título “Com as flores do salgueiro – Homenagem a Bashô”. Aqui se transcrevem algumas composições:
Um pássaro
no ninho: uma gaiola
perfeita.
Crepúsculo. Gaivotas
em repouso velam
o cadáver do sol.
Uma concha bivalve:
borboleta do mar,
de asas fechadas.
Jogo de sedução
entre o vento e as folhas.
Prazer volátil.
Juncos em movimento.
Os cabelos da água
penteados pelo vento.
Borrão azul
na brancura da página:
o poema.
Um pássaro
no ninho: uma gaiola
perfeita.
Crepúsculo. Gaivotas
em repouso velam
o cadáver do sol.
Uma concha bivalve:
borboleta do mar,
de asas fechadas.
Jogo de sedução
entre o vento e as folhas.
Prazer volátil.
Juncos em movimento.
Os cabelos da água
penteados pelo vento.
Borrão azul
na brancura da página:
o poema.
4 comentários:
Gosto muito de pequenos poemas. Beijos.
Ah! O passado
O tempo onde se acumularam
os dias lentos...
Maravilhoso isso, Manuela!
Grato!
Já tentei escrever Kaikai ou Kaiku, mas toda a minha obra resumiu-se a uma unica composição, já publicada em nel mezzo del cammim.
Não tenho na sintese a força do meu texto!
Abraços, mon ami!
Tudo por aqui sempre transpirando sensibilidade e, acima de tudo, inteligencia!
Dificil ver espaços que pingam e respingam inteligencia como este cá teu, mon ami!
Estejas bem nesta noite e em todas as demais!
Caros Amigos,
De facto aprecio o Haikai, considero que se podem trnsmitir ideias/pensamentos/sentimentos...muito importantes, de forma breve. Quando a poesia é longa pode-se ir perdendo, geralmente obriga a mais de uma leitura, duas ou três frases entram completamente. Isto até me faz lembrar publicidade/marketing, a força de um slogan, quando é bem feito. Não estou a excluir dos meus gostos a poesia longa, porque considero que esta tem a vantagem de criar um ambiente cativante, à medida que vai avançando com mais promenores.
Beijinhos,
Manuela
Haikai
é uma das formas de poetizar das quais mais admiro, talvez pela minha inquietude da abstração na palavra e a contemplação dela própria, a palavra.
Poderia ser tbm a magia oriental em tudo, sempre havendo equilíbrio no encontro, com o impar... 3,5,7
Este eu desejava ter propriedade para construção.
Bjinhos Manu
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